Produção sustentável, avanços na atividade agropecuária e desafios para o futuro foram destaque no Fórum do Agronegócio

19/09/2023

“A agricultura brasileira é uma história de sucesso para o mundo”. Foi assim que Rattan Lal iniciou sua conferência na abertura da 4ª edição do Fórum do Agronegócio, no Parque Governador Ney Braga, realizada ontem (18) em Londrina (PR).  O renomado cientista, Prêmio Nobel da Paz (2007) e Prêmio Mundial da Alimentação (2020), destacou o crescimento do agronegócio no País, que saiu de importador de alimentos na década de 1960 para maior exportador de alimentos do mundo nos últimos anos. “Esse é um dos desenvolvimentos mais importantes da história mundial moderna”, acrescentou o cientista. O evento debateu o protagonismo do Brasil frente à produção sustentável de alimentos no mundo, por meio de painéis e palestras com cerca de 20 lideranças e autoridades do setor que falaram dentro da temática “Produzir e Conservar”.

Mesmo com a recente história de sucesso do Brasil, Lal aponta que há problemas que não podem ser ignorados, entre eles a degradação do solo, o uso excessivo de água, a poluição. Essas e outras questões, acrescenta o cientista, podem sim ser relacionadas às mudanças climáticas e é urgente garantir que, principalmente a degradação do solo, sejam controladas. “É preciso tornar a agricultura amiga do clima. Como? Adotando a agricultura regenerativa, cuidando da forma como os alimentos são produzidos e consumidos, por meio do uso controlado de defensivos”, exemplificou.

Lal citou ainda algumas medidas de “agricultura positiva para a natureza” que podem ser adotadas, a exemplo do que já acontece no Brasil, como a produção de combustível a partir da cana-de-açúcar. Ressaltou que o caminho para produzir mais alimentos e poder atender à crescente população mundial em poucos anos, reduzindo ou minimizando os danos ambientais, passa por uma agricultura conservacionista, regenerada e agroecológica. “Devemos trabalhar com a natureza e não contra a natureza”.

Na esteira do processo exemplar que o Brasil tem feito, o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, lembrou que o País vem caminhando nos últimos 50 anos para se tornar um grande provedor de alimentos no mundo por meio da adoção de tecnologia. “A capacidade e a aptidão dos nossos produtores de introduzirem novas tecnologias foram a grande revolução feita pela agropecuária brasileira”, frisou. “Mas não vamos viver olhando para o passado. O nosso desafio é pensar para os próximos 50 anos”, pontuou Fávaro, citando que a produção e produtividade cresceram exponencialmente nas últimas décadas no território brasileiro com apoio da tecnologia, mas a diferença é que agora é preciso que o crescimento se faça sem o avanço do desmatamento.

O ministro destacou ainda a rastreabilidade como uma das melhores práticas para se incorporar, citando o mercado do algodão que está estável no mundo, mas registra avanço da produção e da comercialização brasileira. “Onde está o segredo? Temos rastreabilidade. A fruticultura faz isso muito bem, o café vem fazendo, muitos já fazem com as carnes. A garantia de todos os procedimentos chega ao consumidor e ele paga por isso”.

Silvia Maria Fonseca Silveira Massruhá, presidente da Embrapa, elencou o trabalho de diversas unidades da Embrapa e registrou que a sustentabilidade está no DNA da pesquisa agropecuária. A expansão de área plantada, de produção e produtividade que o Brasil alcançou nos últimos 50 anos foi baseada em ciência e tecnologia. “Impacto econômico, ambiental e social são três dimensões da sustentabilidade que estão no nosso DNA”, reforçou Silvia, concordando com o ministro Fávaro de que não basta apenas olhar pelo retrovisor, o foco precisa estar à frente, mas para isso é preciso dados, informações e indicadores.

“Só dessa forma vamos conseguir mostrar para o mundo o quanto somos sustentáveis”, salientou. Ela destacou que a empresa já conta com grupos de trabalho que estão levantando indicadores de sustentabilidade, entre eles metas de carbono. Ressaltou ainda que, hoje, é preciso realmente olhar para o novo consumidor que está muito mais preocupado com nutrição, saúde, origem dos alimentos e transparência em processo de produção. “A rastreabilidade é outro trabalho que estamos desenvolvendo na Embrapa”, adiantou.

Ao lado de Silvia e de Fávaro no painel “Alimentos, fibras e energias renováveis: a integração das cadeias produtivas, a demanda por investimentos e as práticas sustentáveis”, o presidente da Associação Brasileira de Criadores de ZEBU (ABCZ), Gabriel Garcia Cid, corroborou a fala do ministro, destacando que a entidade tem como pauta o estímulo a práticas sustentáveis de produção, aliadas a uma gestão eficiente. Dessa forma, acrescentou, que todo produtor consegue produzir mais e melhor e em menor área e menos tempo.

Marcelo Janene El-Kadre, presidente da Sociedade Rural do Paraná, integrou os debates da segunda mesa-redonda do evento, que abordou a “Resiliência dos sistemas alimentares: fortalecer do local para o global”. Na sua opinião o Brasil é muito bom no que faz e precisa falar para o mundo. “No nosso País temos condições favoráveis, clima, áreas externas, áreas degradadas que podem ser melhoradas e principalmente temos o produtor brasileiro, que não se encontra igual no mundo”, enalteceu.

Ressaltou que é preciso olhar para os problemas que estão acontecendo, a exemplo das mudanças climáticas que podem reduzir até 17% a produção de alimentos, e se atentar ainda mais para programas de boas práticas, como o Lavoura-Pecuária-Floresta. Ainda pontuou sobre a fome e o desperdício de alimentos no Brasil e no mundo, “que beira o absurdo”. Em 2019, lembrou El-Kadre, dados da ONU mostraram que o mundo registrou o desperdício de cerca de 930 milhões de toneladas de alimentos. O uso excessivo de defensivos, prejudicando solo e água, foi outro ponto de alerta. Soluções, indicou ele, passam pelo desenvolvimento de redes, capacitação e investimento.

Refletindo sobre a resiliência do setor, o secretário de Agricultura e Abastecimento do estado do Paraná, Norberto Ortigara, destacou desafios e oportunidades, e indagou sobre como será possível chegar até o consumidor do futuro, lembrando que a atividade agropecuária diz respeito ao básico: produção de alimentos, nutrição e preservação ambiental. “Tudo o que a gente faz para produzir ainda melhor, usando menos recursos do bolso e da natureza, qualifica nosso negócio”, garantiu.

A terceira mesa-redonda do Fórum trouxe o debate sobre “Futuro alimentar sustentável: o Brasil e a produção de alimentos frente ao mundo” e chamou a atenção para ações do campo à indústria. Rafael Zavala, representante no Brasil da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), propôs o desafio de se pensar a produção a partir do conceito de bioeconomia e traçar estratégias para reduzir a dependência de insumos a mais de 10 mil quilômetros de distância.

Zavala ainda alertou que hoje a segurança alimentar está “sob uma tempestade perfeita”, o que amplia diretamente as causas da fome no mundo: Conflitos armados, choques econômicos, choques climáticos, choques sanitários. Por isso, segundo ele, a necessidade de se pensar em produzir, com menos agressão ao meio ambiente, principalmente. “A boa notícia é que temos a tecnologia como aliada”.

O presidente do Sistema Ocepar, José Roberto Ricken, concordou sobre a necessidade de produzir alimentos, mas atentou que mais que produzir é preciso ter claro o que é preciso levar para a mesa da população mundial. Nesse sentido, pontuou sobre o crescimento da população em regiões menos desenvolvidas, como a África, destacando os hábitos de dietas em relação à renda de cada local. “Nos países menos desenvolvidos necessitam mais de grãos, raízes, arroz e feijão. Nos mais desenvolvidos, de produtos funcionais. Precisamos ter isso em mente para saber o que produzir e qual alimentos levar para cada região”.

Processos agrícolas

O economista, engenheiro agrônomo e especialista em agronegócios no Brasil, Alexandre Mendonça de Barros, fechou a programação do Fórum com a palestra “O futuro sustentável do agronegócio e a integração das cadeias produtivas” e pontuou que é preciso olhar para a produção sob o ponto de vista da sustentabilidade, da economia e das questões sociais.

Ele também chamou a atenção sobre a organização dos processos agrícolas que estão mudando muito nos últimos anos, no sentido de importação e exportação. O economista alertou para esse movimento no processo de estocagem de alimentos, lembrando que os estoques estão baixos e qualquer situação pode gerar um rápido desequilíbrio na venda de alimentos.

Participaram do 4º Fórum do Agronegócio lideranças que são referências na cadeia agro: o cientista indiano Rattan Lal, o ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, o presidente da Associação Brasileira de Criadores de ZEBU (ABCZ), Gabriel Garcia Cid, o presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG), Luiz Carlos Corrêa Carvalho, o presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), Sérgio Bortolozzo, a presidente da Embrapa, Silvia Maria Fonseca Silveira Massruhá, a diretora da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq-USP), Thais Maria Ferreira, o secretário da Agricultura e do Abastecimento do Paraná, Norberto Ortigara, o diretor de Assuntos Regulatórios e Científicos da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (ABIA), Alexandre Novachi, o diretor na Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Bruno Lucchi, o diretor do Centro de Excelência contra a Fome e representante do Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas no Brasil, Daniel Balaban, o coordenador do Centro de Estudos do Agronegócio da FGV (FGV Agro), Guilherme Soria Bastos, o presidente da Sociedade Rural do Paraná, Marcelo Janene El-Kadre, o diretor de Produção Sustentável e Irrigação do MAPA, Bruno Brasil, o presidente do Conselho Agronegócio COSAG-FIESP, Jacyr Costa Filho, o presidente do Sistema Ocepar, José Roberto Ricken, o representante no Brasil da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), Rafael Zavala, a presidente da SL Alimentos, Roberta Meneghel, o líder de Nutrição da Unilever Brasil, Rodrigo Visentini e o engenheiro agrônomo e economista, Alexandre Mendonça de Barros. A moderação dos debates foi conduzida pelos jornalistas Fernando Lopes (editor do InfoMoney), Cassiano Ribeiro (editor do Globo Rural) e Vera Ondei (editora da Forbes Agro).